domingo, 24 de maio de 2015

TERAPIA DE REPOSIÇÃO HORMONAL (ESTROGÊNIO) E A REDUÇÃO DO RISCO DE CALCIFICAÇÃO DAS ARTÉRIAS CORONÁRIAS.


Artérias Coronárias

As artérias coronárias são os primeiros ramos colaterais da artéria aorta, principal vaso eferente do coração, e servem para o suprimento do próprio coração. Normalmente, os seres humanos desenvolvem duas artérias coronárias, uma esquerda e outra direita. Cada artéria é responsável pela irrigação de uma parte do miocárdio, músculo estriado inervado pelo sistema nervoso visceral, cuja função é a contração que promove o bombeamento cardíaco e a distribuição de sangue oxigenado para os tecidos corporais durante a circulação sistêmica.

Rede vascular do coração. Observe como as artérias coronárias direita e esquerda, através de seus ramos, irrigam territórios determinados do coração. Artérias coronárias esquerda e direita estão destacadas (NETTER, 2007)

Calcificação de artérias coronárias

A aterosclerose é a formação de placas de gordura, chamadas de ateromas, na parede das artérias. A doença arterial coronariana  é o processo de aterosclerose que afeta as artérias coronárias. O crescimento progressivo dos ateromas nessas artérias pode levar a um prejuízo do fluxo de sangue até o miocárdio. Este processo é chamado de isquemia miocárdica crônica.
Deposição de placas de ateroma na parede de uma artéria, o que dificulta ou impede a perfusão dos territórios irrigados por aquela artéria.
O sofrimento do miocárdio devido ao processo de aterosclerose coronariana é conhecido como cardiopatia isquêmica. Outra complicação grave da aterosclerose é a hemorragia ou rompimento da placa de ateroma, liberando fragmentos que caem na corrente sanguínea, podendo levar a formação de coágulos sobre sua superfície (trombose coronariana). Este "acidente da placa de ateroma" pode obstruir a luz da artéria de uma forma abrupta e intensa. Nesta situação ocorre um prejuízo significativo do fluxo de sangue (isquemia miocárdica aguda), podendo levar a um quadro de angina do peito instável ou infarto do miocárdio, situações potencialmente fatais.
Cardiopatia isquêmica causada por obstrução das artérias coronárias

A doença arterial coronariana é a principal causa de morte em todo o mundo, afetando indivíduos de todas as raças. O escore de cálcio  é capaz de avaliar a presença e a gravidade da doença arterial coronariana.

O Escore de Cálcio

O Escore de Cálcio quantifica a calcificação das artérias coronárias, sendo um marcador da presença e extensão da  aterosclerose nessas artérias. A avaliação do escore de cálcio acrescenta informações no diagnóstico da doença arterial coronariana, complementando outras informações de fatores de risco clínico, podendo alterar e/ou acrescentar condutas, principalmente em pacientes classificados como risco intermediário pelo escore de Framingham (este escore utiliza variáveis como sexo, idade, tabagismo, pressão arterial sistólica ou máxima, colesterol total e HDL-colesterol, para avaliar o risco de um infarto do miocárdio e morte em 10 anos de acompanhamento).

Terapia de Reposição de Estrogênio e Doença Coronariana

Em recente estudo conduzido por Manson et al., foram avaliadas 1.064 mulheres com média etária de 55 anos, com antecedentes de histerectomia e que foram tratadas com estrogênios por 7,4 anos (média). Foi avaliado impacto do estrogênio conjugado equino (0,625 mg/dia) sobre o risco de calcificação de artérias coronárias. Nesse estudo, foi observado de forma clara e surpreendente significativa redução (42%, p=0.03) no número de calcificações nas artérias coronárias das usuárias de estrogênios, quando comparadas ao grupo placebo. A média do escore de cálcio da artéria coronária foi menor entre as mulheres que receberam estrogênio (83,1) do que entre aqueles que receberam placebo (123,1).

Esse estudo enfatizou a importância de compreender outros mecanismos pelos quais os estrogênios inibem a calcificação vascular, como os mediados por vários genes que regulam a homeostasia cálcica nas células vasculares, com destaque para o da osteoprotegerina. Esse estudo também confirmou a "hipótese do tempo" para a terapia com estrogênios, que estabelece que os benefícios na prevenção da aterosclerose ocorrem somente quando ela é iniciada antes do desenvolvimento da aterosclerose avançada, ou seja, em idades mais precoces, quando a parede vascular ainda exibe alterações discretas.

Apesar de essa pesquisa confirmar a hipótese de que o estrogênio pode reduzir o risco da DCV em mulheres entre 50 a 59 anos de idade, é importante enfatizar que a terapia hormonal não deve ser considerada como uma estratégia para prevenir a DCV. O estrogênio tem efeitos biológicos complexos e podem influenciar o risco de eventos cardiovasculares e de outros resultados através de múltiplas vias. Esse fato deve ser considerado visto que o tratamento inadequado pode trazer consequências ruins para o paciente.

Talvez, no futuro, a terapia estrogênica possa ser indicada como prevenção para risco cardiovascular num grupo seleto de mulheres: jovens, sem fatores de risco para aterosclerose subclínica, como a resistência insulínica, ou após serem submetidas a algum método de avaliação do grau (estágio) da aterosclerose que a mulher apresente. Mas, como a transferência de conhecimentos da investigação básica para a clínica requer um processo cooperativo e interativo conduzido com paciência e persistência, entendemos que ainda é prudente aguardar os resultados dos estudos em andamento.

REFERÊNCIAS:

ALDRIGHI, José M.; RIBEIRO, Alessandra Lorenti. Terapia com estrogênio após a menopausa reduz o risco de calcificação na artéria coronária. Rev. Assoc. Med. Bras.,  São Paulo ,  v. 53, n. 4, p. 284, Aug.  2007 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-42302007000400002&lng=en&nrm=iso>. access on  24  May  2015.

DIPPPE JR, Tufi. Escore de cálcio nas artérias coronárias. 2008. Disponível em: < http://portaldocoracao.uol.com.br/exames/escore-de-calcio-nas-arterias-coronarias
>. Acesso em: 24 mai. 2015

Manson JE, Allison MA, Rossouw JE, Carr JJ, Langer RD, Hsia J, et al. Estrogen therapy and coronary: artery calcified. N Engl J Med. 2007;356(25):2591-602.

NETTER, Frank H.. Atlas de Antomia Humana. 4ª ed.. Porto Alegre: Artmed, 2007.

8 comentários:

  1. É válido lembrar que se confirmou a "hipótese do tempo" para a terapia com estrogênios, que estabelece que os benefícios na prevenção da aterosclerose ocorrem somente quando ela é iniciada antes do desenvolvimento da aterosclerose avançada, ou seja, em idades mais precoces, quando a parede vascular ainda exibe alterações discretas.
    Muitas possibilidades estão sendo exploradas para entender como as características biológicas da parede vascular e como os efeitos cardiovasculares dos estrogênios diferem entre mulheres numa fase inicial da pós-menopausa e aquelas cujas menopausas ocorreram há muito tempo. Assim, admite-se que a expressão dos receptores de estrogênios ocorre em diferentes graus nos vasos sanguíneos, à medida que a aterosclerose progride.
    Ademais, a regulação de genes específicos, mediada pelos estrogênios, pode ter conseqüências diferentes nos vasos jovens e nos envelhecidos; como exemplo, a indução mediada pelos estrogênios de metaloproteinases, enzimas que degradam os componentes da matriz extracelular, pode ajudar a preservar a luz vascular na aterosclerose precoce, mas também pode desestabilizar um vaso com doença mais avançada, produzindo erosão e ruptura da placa.

    Fonte:
    http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0104-42302007000400002&script=sci_arttext

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  2. É interessante pensar que, ao mesmo tempo que a TRH está relacionada a problemas cardiovasculares como maior risco de tromboembolismo venoso, é benéfica na relação da redução da chance de calcificação das artérias coronárias. Quanto aos efeitos maléficos do estrogênio, destaca-se o efeito no mecanismo de coagulação que pode contribuir ou ser responsável por um estado de hipercoagulação generalizado. Os estrogênios orais afetam a síntese de fatores de coagulação por um efeito de primeira passagem hepática. Além disso o uso de estrogênio por via transdérmica provavelmente se associa com um risco menor para eventos tromboembólicos em comparação ao uso de estrogênio oral. Nesse sentido, hoje, através de vários estudos, a TH permanece contra-indicada somente a mulheres que apresentaram eventos arteriais prévios (IAM ou AVC), ou aquelas com diversos fatores de risco cardiovascular, particularmente se pertencentes a faixas etárias mais elevadas ou apresentando período pós-menopáusico longo (mais de 10 anos) e é segura caso o tratamento seja utilizado no período pré-menopausa ou no primeiro ano da menopausa. como já dito na postagem e comentários
    Fonte:http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0004-27302007000700006&script=sci_arttext

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  3. Desde a década de 1960, sabe-se que o uso de estrógenos está relacionado a um aumento na incidência de episódios tromboembólicos. A terapia de reposição hormonal utilizando baixas dosagens de estrógeno, associado ou não a progestágeno, vem sendo indicada em proporções cada vez maiores para mulheres durante e após a menopausa, objetivando não só um alívio nos
    sintomas, mas também a redução da incidência de doença coronariana e do risco de fraturas devido à osteoporose. Estudos controlados e envolvendo um número significativo de participantes, avaliando o verdadeiro risco-benefício do seu uso, só foram realizados recentemente. Esses estudos apresentaram resultados conflitantes sobre os benefícios, mas confirmaram os riscos, como a maior incidência de episódios tromboembólicos. A maioria de preparações utilizadas atualmente na terapia de reposição hormonal (TRH) contém uma associação de estrógeno e progestágeno. O estrógeno utilizado nessas preparações pode ser natural (estradiol, por exemplo), sintético (etinilestradiol, por exemplo) ou conjugados eqüinos. Os estrógenos presentes nas preparações orais são geralmente associados a um progestágeno relacionado estruturalmente ou à progesterona ou à testosterona, sendo o acetato de medroxiprogesterona
    o mais comumente utilizado. O uso isolado de estrógeno ocasiona um aumento na incidência de câncer de endométrio, sendo, por este motivo, indicado apenas em mulheres já submetidas à histerectomia. Um dos mecanismos de ação do estrógeno e da progesterona é através da interação com receptores específicos – os receptores estrogênicos a e ß e os receptores de progesterona A e B, pertencentes a uma superfamília de proteínas mediadoras dos efeitos dos
    hormônios esteróides. A interação entre estrógeno e receptores estrogênicos presentes nas células endoteliais é responsável por diversas ações reguladoras nos componentes da parede vascular. Especial interesse existe em torno dos efeitos desta interação com ações sobre o metabolismo lipídico, o tônus vasomotor, a resposta da célula muscular lisa à lesão, a redução dos níveis de homocisteína e a redução de moléculas de adesão celular sobre a resposta inflamatória, sobre fatores da coagulação e inibidores da coagulação.

    http://www.jvascbr.com.br/03-02-01/03-02-01-17/03-02-01-17.pdf

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  4. Em um artigo de revisão publicado no jornal vascular brasileiro, a autora, Maria Elisabeth Rennó de Castro Santos, concluiu que, apesar das evidências positivas da terapia de reposição hormonal no alívio dos sintomas da menopausa e na prevenção da osteoporose, seu uso como prevenção de riscos cardiovasculares é questionável. De acordo com o artigo, evidências científicas
    apontaram um aumento no número de tromboses
    arteriais e venosas. O artigo conclui, no entanto, apontando ressalvas quanto a diversos fatores ainda obscuros no estudo dos efeitos da TRH, dentre eles seu mecanismo de ação nas vias de coagulação.

    Fonte: http://www.jvascbr.com.br/03-02-01/03-02-01-17/03-02-01-17.pdf

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  5. Durante um estudo sobre a relação entre os níveis de estrogênio e de adiponectinas séricas, s níveis de TNFα foram significativamente maiores após a menopausa, sugerindo que a deficiência de estrogênio resulta no aumento de citocinas inflamatórias séricas, o que pode contribuir para o desenvolvimento de aterosclerose e diabetes melito tipo 2. Além disso, foi relacionado positivamente os níveis de estrogênio e de leptina sérica. Entretanto, os níveis absolutos de leptina sérica apresentam-se aumentados com o aumento da massa corpórea, o que parece contribuir significativamente para a resistência insulínica. No entanto, a resistina sérica não se altera significativamente quando comparada entre as mulheres, antes e depois da menopausa, normalizando pelo IMC ou não. Esse fato sugere que os níveis circulantes de resistina não possuem papel fundamental na resistência insulínica e não é regulada pelo estrogênio em humanos. O que é percebido é que as relações da aterosclerose com a deficiência de estrogênio são perceptíveis, mas o uso da terapia de reposição hormonal (TRH) não vai ser a responsável pelo tratamento, como parece a postagem propor. Isso mostra-se ainda mais perceptível pela indicação de não recomendar-se a TRH sem uma mudança no estilo de vida da paciente, pois complicações como essa muitas vezes estão relacionadas com outros fatores na qualidade de vida da paciente e varia de paciente para paciente. O TRH deve ser visto como uma reposição e não como tratamento em si, até por causa das outras complicações do estrogênio.

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  6. Importante ressaltar que, apesar do papel anticalcificante das terapias de reposição de estrogênio, esse hormônio tem uma forte ação estimulatória dos processos de coagulação sanguínea, como aumento da concentração circulante dos fatores de coagulação II, VII, IX e X, plasminogênio, diminuem a concentração da antitrombina III, proteína que inativa diversas enzimas da cascata de coagulação sanguínea, e aumenta a adesividade plaquetária. Todos esses fatores indicam uma predisposição de superposição de placas de coagulação sobre os depósitos de cálcio mais rápido do que o cálcio possa ser retirado pela própria ação do estrogênio sobre as placas.

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